Um caso muito estranho que marcou o ano de 2005 foi o proselitismo que o mercado fez às esquerdas através da via cultural.
Sabe-se que setores de centro-direita se infiltraram nas esquerdas médias para impor o mesmo "popular demais" que dominava na mídia hegemônica.
2005 era o ano de dois filmes em que se pregava um "dirigismo cultural" às forças progressistas.
Um foi o documentário Sou Feia Mas Tô Na Moda, feita por uma ex-jornalista da Rede Brasil Sul (RBS), Denise Garcia.
O documentário, sobre as intérpretes de "funk carioca", teve o patrocínio não creditado da Globo Filmes, até para evitar monopólio do mercado.
A Globo já havia produzido o outro filme, Os Dois Filhos de Francisco, de Breno Silveira, ex-diretor de clipes da antiga MTV Brasil.
O filme é uma biografia em forma de dramaturgia da dupla breganeja Zezé di Camargo & Luciano.
De perfil conservador, a dupla foi empurrada para as esquerdas médias apenas por um pequeno e tendencioso fator: haviam votado em Lula para a Presidência da República, em 2002.
Foi um aspecto nem muito convincente para creditar algum progressismo, mas ele foi superestimado pelo discurso proselitista.
Fatos como o patrocínio das Organizações Globo ao filme e o fato da dupla ter votado em Ronaldo Caiado para deputado federal foram ignorados.
Intelectuais ligados ao establishment midiático, mas "queridinhos" das esquerdas médias, como Paulo César Araújo e Pedro Alexandre Sanches, também fizeram altos elogios à dupla.
A reputação do melodrama de Breno Silveira fazia com que a dupla tivesse seus quinze minutos de fama ao lado de cineastas e intelectuais mais descolados.
A trilha sonora era tendenciosa, sob direção musical de Caetano Veloso e tinha a dupla cantando ao lado de alguns emepebistas complacentes.
Era, na verdade, um acordo para a MPB ter acesso aos eventos musicais em regiões dominadas pelo "sertanejo", como o interior do Nordeste e as regiões Norte e Centro-Oeste.
Um dado sombrio que se nota é que, por trás da imagem "humanista" da dupla, as redes sociais davam uma demonstração de pura sociopatia.
Fanáticos da dupla faziam "patrulhamento" para ver quem não era fã da dupla e faziam cyberbullying contra quem fizesse alguma crítica aos dois cantores.
Era um reacionarismo que setores das esquerdas não compreendem até hoje, pois os fascistas digitais, já atuantes entre 2005 e 2007, são os maiores fãs de "funk" e "sertanejo".
Passado o tempo desse proselitismo religioso, a coisa saiu diferente do esperado.
Zezé di Camargo & Luciano, em vez de se tornarem "gênios da MPB", se tornaram musicalmente ainda mais confusos.
Eles sempre foram medíocres, mas ao menos tinham uma direção sonora, ruim mas definida.
"É o Amor" é uma música sem pé nem cabeça como nos primórdios da música cafona, em que certas canções queriam ser ao mesmo tempo bolero e country, sem se definir estilisticamente em coisa alguma.
A definição era apenas estética, dentro de um caipira estereotipado com canções melosas.
Com o tempo, Zezé di Camargo passou a agir como uma subcelebridade se alimentando com factoides e polêmicas desnecessárias.
Em seguida, passou a apoiar Aécio Neves na campanha de 2014, "descontente" com os rumos do PT no poder.
O conservadorismo enrustido de Zezé di Camargo & Luciano foi um balde de água fria nas esquerdas médias.
Elas acreditavam que o "sertanejo", na verdade um gênero patrocinado pelo latifúndio, iria fazer a tal "reforma agrária da MPB" que pregava a intelectualidade "bacana".
Até a Carta Capital havia mordido a isca em 2005, por influência desse proselitismo.
Ao longo dos anos, alguns "heróis" desse proselitismo se aliaram de vez com a mídia hegemônica e o conservadorismo social. Até MC Guimê apareceu na capa de Veja, com matéria elogiosa.
O proselitismo durou muito tempo, mas os surtos da moçada "popular demais" criou, nos bastidores, uma decepção nas esquerdas nunca oficialmente revelada.
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