Qual o limite da sensualidade feminina e para que serve a tal da "liberdade do corpo"?
O "direito ao corpo" de uma parcela de mulheres "sensuais" serve para elas ou para o público masculino que as cultua?
Que feminismo pode se esperar de uma mulher que aceita ser brinquedo sexual de seus fãs sob a desculpa que está "casada" com eles?
Até que ponto a mulher pode viver de sua própria "sensualidade"?
Nestes últimos quinze anos em que a chamada "cultura popular demais" sofreu uma grande blindagem de uma parcela de intelectuais, a chamada "intelectualidade bacana", muitos exageros atribuídos às classes populares passaram em branco no debate público.
Agora que os governos progressistas se dissolveram pelo golpe político dos últimos meses e os "mui amigos do povo" que integram a intelligentzia dotada de visibilidade plena se sossegaram no seu esquerdismo de fachada, a onda agora é parar para pensar.
Afinal, as esquerdas erraram ao dar ouvidos a intelectuais que vinham pregar a "revolução do brega", inserindo na mídia esquerdistas preconceitos sociais típicos da Rede Globo e Folha de São Paulo.
Queriam que veículos como Caros Amigos, Carta Capital e até Brasil de Fato endossassem visões sobre cultura popular mais apropriadas para um editor ultraconservador do Estadão.
Ultimamente, o Estadão está mais entusiasmado com a breguice cultural, o que surpreendeu até seus leitores direitistas mais ortodoxos, que protestaram contra esse aparente populismo editorial.
A direita ortodoxa odeia o brega, mas a direita heterodoxa, que predomina nas Organizações Globo e Folha de São Paulo, com representantes até na revista Caras, adora, e muito, o brega.
Certa vez, o Estadão veio com essa: definiu os anos 90 como "menos caretas" só por causa de fenômenos como É O Tchan e a Banheira do Gugu.
Sim, o Estadão que demitiu Maria Rita Kehl porque ela destacou pontos positivos do governo Dilma Rousseff.
A gente até pergunta se o cavalo que leva um jornaleiro no logotipo do jornal O Estado de São Paulo não seria um simpatizante da Eguinha Pocotó.
E aí temos um episódio em que a hipersexualização, que gerou as tais "mulheres-frutas" e que fazia a fortuna do "pagodão" baiano e do "funk carioca", foi longe demais.
Rita Cadillac, que havia feito uma participação no programa Tudo Pela Audiência, com Tatá Werneck e Fábio Porchat, no Multishow, foi convidada para participar do programa de entrevistas deste último, na Rede Record.
Como um Jimmy Fallon brasileiro, Porchat inclui brincadeiras inusitadas em seu programa, que desafiam os convidados em cada edição.
Aí Porchat criou uma "sarjeta da fama", uma espécie de paródia da "calçada da fama" em Los Angeles.
O apresentador pediu para a produção montar um molde de cimento, e depois convidou Rita a deixar as marcas das mãos no molde, como fazem os atores de Hollywood na Calçada da Fama.
Só que, quando ela se agachou, a câmera se dirigiu para o traseiro, diante de comentários relacionados à "sarjeta da fama".
Ela ficou irritada e, nos bastidores, durante o intervalo, demonstrou revolta e resolveu sair do programa. Só dias depois ela pediu desculpas.
É certo que, mesmo dentro do âmbito popularesco, ela não é um "par de glúteos" ambulante. A título de comparação, perto do que uma Mulher-Melão (Mulher-Objeto?) faz, Rita Cadillac é bem mais comportada e versátil em suas atividades.
Ela foi assistente de palco do Cassino do Chacrinha e, juntamente com Gretchen, havia pego a onda da disco music, lançando alguns discos.
Não era culturalmente muito relevante, mas a atitude do programa de Porchat com Rita Cadillac realmente foi longe demais.
Mas também a hipersexualização da mulher associada aos fenômenos "populares" nunca foi devidamente questionada pela intelectualidade.
As esquerdas deixaram passar, só questionando a exploração leviana da imagem da mulher quando a vítima é a mulher de classe média e o veículo associado a agências de publicidade e a grande mídia.
O brega e o "funk" muito ridicularizaram a mulher das classes populares, criando uma imagem pejorativa da mulher com traseiro grande, cujo alvo foram sobretudo negras, índias e, no geral, trabalhadoras que não se enquadravam em padrões estéticos vigentes.
Isso foi tratado sob vista grossa mesmo por mulheres que desempenhavam papel de antropólogas, cineastas documentaristas e, em tese, feministas assumidas.
Pode até ser que Rita Cadillac e Gretchen tenham sido vítimas desse processo voraz, enquanto suas sucessoras pareciam mais resignadas e até orgulhosas no seu "trabalho".
Mas ninguém debateu esse problema de frente, e justamente a intelectualidade que se dizia "sem preconceitos" tentava impedir qualquer tipo de debate, sob a desculpa de que "questionar é discriminar".
Vinham com esse papo de "higienismo elitista" que atribuíam a qualquer questionamento em relação a dita "cultura popular demais".
Preferiam que os debates sobre o machismo fossem restritos ao que comerciais de detergente e automóveis faziam com as mulheres. Ou com as lojas de roupas, grifes de moda, produtos cosméticos, faziam. Ou revistas como Cláudia, Boa Forma, Marie Claire, associadas à mídia venal.
Mas achavam que o machismo, quando era vinculado de alguma forma às "periferias", era "lindo" e expressava até um suposto feminismo.
Para a intelectualidade "bacana", machismo na vida das mulheres pobres é refresco.
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