Quando eu falo que a esquerda precisa se reinventar, não virei direitista. Pelo contrário, continuo de esquerda desde a segunda metade de 1987, e sem verba pública, sem dinheiro de Lei Rouanet, Ministério da Cultura ou coisa parecida.
Dá dó ver alguns jornalistas vindos do Estadão e da Folha agora serem "esquerdistas de verdade". Fácil ser um "jornalista livre" com dinheiro de George Soros e consultando o saldo bancário antes de fazer qualquer ataque aos barões midiáticos.
Dá até para imaginar. "Xiiii. O dinheiro de Soros não chegou na minha conta. Já estou me arrependendo de ter chamado William Bonner de sósia do Collor. Ia até chamar o outro William, o Waack, de 'palhaço da Casa Branca', mas como a grana de Soros não chegou até agora...".
E aí chega a graninha do George Soros. "Oba! Já dá para falar mal do baronato midiático, chamar Miriam Leitão de 'bruxa velha'. 'Sampleei' uns jargões que peguei do Conversa Afiada e do Escrevinhador. Se eu ganhasse num mês o PIB da Grã-Bretanha, já dá até para espinafrar a Folha de São Paulo", sonha o jornalista.
Fácil ser "jornalista livre" coma graninha de Soros. Ser "patrão-de-si-mesmo" e "esquerdista" por profissão, esperançoso em um dia pôr seus pés sujos de golpismo midiático na porta de entrada do Centro Barão de Itararé. Ser, num dia, uma marionete do Projeto Folha e, no outro, apostar num anarcocapitalismo fukuyamiano que se autopromove com falsos ataques ao baronato midiático.
Esses "coletivos" que andam recebendo por fora a grana da Soros Open Society - daí o termo soros-positivos - para criar uma equação sociológica onde cabem a supremacia da tecnologia digital sobre o ativismo social e uma forma de combater a pobreza sem, de fato, combater a pobreza, não são lá muito confiáveis.
E aí surgem vários "coletivos". Os Fora-do-Eixo, os Jornalistas Ninjas, agora os tais Jornalistas Livres. E a onda agora é atacar a Globo, atacar Aécio Neves, espinafrar a Veja e, se as verbas de George Soros permitirem, esculhambar até a Folha de São Paulo que serviu de laboratório cerebral para essas pessoas.
O que eles não têm de confiáveis é o discurso tecnocrático que possuem, que deslumbram as esquerdas médias que, com razão, levam o esquerdismo ao fundo do poço. É, portanto, uma esquerda que faz Reinaldo Azevedo, Rodrigo Constantino e Rachel Sheherazade dormirem tranquilos, porque sabem eles que é uma esquerda que late demais e morde de menos, graças aos pseudo-esquerdistas que confiscaram as bússolas para seus timões.
Esses "coletivistas" juram de pés juntos que os movimentos sociais são guiados por um clique de um mouse, que as causas sociais reduzem-se agora a hashtags e a revolução socialista agora age em função de um sinal de sustenido antes de uma palavra. Acham que os ativistas sociais agora são instrumentos das novas mídias, essas sim as "líderes" dos movimentos sociais do Brasil e do mundo.
Muito duvidosa essa tese. E imaginar que os #JornalistasLivres pensam, em termos de "ativismo" digital, igualzinho ao Carlos Alberto di Franco do "time adversário", colega de Geraldo Alckmin na Opus Dei e nos cafés intelectuais do Instituto Millenium que os "coletivos" fingem odiar.
E isso ocorre como se nós esquecêssemos ou ignorássemos que Geraldo Alckmin patrocinou uma reunião do Coletivo Fora do Eixo e esse grupo apoiou Yoani Sanchez, "paraninfa" do Instituto Millenium e musa do baronato midiático.
Mas faz sentido porque esses "ativistas" acreditavam que a revolução do folclore brasileiro viria com Odair José, Banda Calypso, Zezé di Camargo, Raça Negra, Valesca Popozuda, MC Guimê e Gaby Amarantos, todo mundo depois apunhalando as esquerdas pelas costas e comemorando seus louros abraçados aos barões da grande mídia.
George Soros é um especulador financeiro e empresário que transforma o mundo em um brinquedo seu. Querendo que o capitalismo neoliberal saia vitorioso na luta entre esquerda e direita - remanescentes menos perigosos da antiga Guerra Fria - , ele manipula os movimentos esquerdistas do mundo inteiro como uma criança usando bonecos para serem vilões de sua aventura imaginária.
Daí uma esquerda que "espetaculariza" os movimentos sociais e enfraquece as agendas progressistas. Um feminismo confuso que se baseia no ódio aos homens e nada resolve diante da violência machista (até porque o status quo ainda colocam tais homens como padrão para as conquistas amorosas). Um ativismo esquizofrênico que aposta num estranho "orgulho de ser pobre" que faz a direita cair em gargalhadas.
A mulher pobre não quer ser prostituta, quer aprender outros empregos, e vai o "ativista" e o "etnógrafo" de plantão dizer que ela tem que ser prostituta a vida toda e lhe dá de presente uma carteirinha de trabalho, um registro sindical e uma rádio comunitária tocando barbaridades musicais.
O jovem pobre quer tocar violão, aprender melodias que nem fazia Cartola e Nelson Cavaquinho em outros tempos, queria ter a força artística de um Gonzagão, mas vai o "jornalista livre" dizer que isso é "higienismo" e que o cara só tem que pegar um microfone e vociferar umas bobagens funqueiras.
O "bondoso ativista cultural" lhe tira até da mão a gaita que o menino da periferia pegava para arriscar uns sons melódicos. "Primeiro seja funqueiro e cante aquelas letras pedindo o fim do policiamento nas favelas, depois a gente vê se você vai tocar gaita ou não", impõe, severamente, o tal "jornalista livre" que jura de joelhos que é "esquerdista pra valer".
Esses "coletivos" soros-positivos deveriam escrever dois livros de auto-ajuda. Um deles poderia ser intitulado Como Sair da Pobreza Sem Deixar de Ser Pobre, dedicado ao "orgulho de ser pobre" e à esperança de que, com pouca cidadania e mais consumo, se construirá a prosperidade econômica nas periferias sem que represente uma real qualidade de vida.
Outro deveria se intitular Como as Máquinas Podem Comandar os Movimentos Sociais, um manual de como as "novas mídias digitais", em vez de se tornarem instrumentos de facilitação da mobilidade social, se tornam os líderes absolutos do ativismo social.
São as causas sociais reduzidas a hashtags no Twitter e no Facebook. A humanidade reduzida a um instrumento das "novas mídias", e não o contrário. Mais uma vez o homem torna-se escravo da máquina, mas desta vez com a falsa impressão de estar realizando um ativismo social.
Com isso, "revoltados" da direita e "coletivos" esquerdistas trocam acusações, ataques e sarcasmos, como numa rinha de galos ideológica. Dois lados de uma mesma moeda neoliberal, em que uns se acham com mais razão que outros e todo mundo está errado. O país não crescerá com uns nem com outros. E George Soros é o que mais lucra em cima dos dois lados.
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